Artigo – A importância das árvores nos sistemas de produção agropecuários

Foto em destaque: Karina Pulrolnik
Pesquisadora da Embrapa Cerrados
No dia 21 de setembro, é celebrado o Dia da Árvore, uma data dedicada à conscientização sobre a importância das árvores para o nosso planeta.
O Brasil possui aproximadamente 496 milhões de hectares de florestas, desse total, 486 milhões de hectares são de florestas naturais, enquanto cerca de 10 milhões de hectares correspondem a florestas plantadas. Apenas 2% da cobertura florestal nacional provém de florestas plantadas, enquanto a maior parte é de vegetação nativa — um patrimônio que precisa ser conservado e preservado.
As árvores, quando implantadas corretamente, têm papel central na sustentabilidade dos sistemas agropecuários, oferecendo benefícios que vão além da produção de madeira ou frutos. No Brasil, práticas como a Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) e os Sistemas Agroflorestais (SAFs) vêm sendo estudadas e adaptadas pela Embrapa Cerrados. Essas práticas contribuem para recuperar áreas degradadas, aumentar a biodiversidade, melhorar a qualidade do solo e da água, além de armazenar carbono e fortalecer a resiliência climática.
Na região do Cerrado, a Embrapa Cerrados tem liderado ao longo dos seus 50 anos de atuação, completados neste ano, pesquisas e validações de sistemas integrados que associam árvores, lavouras e pastagens em diferentes arranjos. Os sistemas integrados com árvores podem ser definidos como: integração pecuária-floresta (IPF), ou sistema silvipastoril, que associa pastagem, animais e árvores em consórcio; integração lavoura-floresta (ILF), ou sistema silviagrícola, que combina plantações agrícolas com espécies arbóreas e integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF), ou sistema agrossilvipastoril, que integra os três componentes agrícola, pecuário e florestal — na mesma área, por meio de rotação, consórcio ou sucessão.
Um exemplo é a implantação de eucalipto consorciado com braquiária e soja em áreas de pastagens degradadas. Nesses sistemas, a introdução das árvores proporciona sombreamento e aumento da matéria orgânica no solo, reduzindo a erosão e elevando a fertilidade. Estudos de longo prazo conduzidos pela unidade mostram que áreas degradadas recuperaram sua capacidade agrícola em poucos anos, oferecendo novas fontes de renda com a madeira e aumentando a produtividade.
Outro caso é o desenvolvimento de arranjos de SAFs e sistema de ILPF com espécies nativas do Cerrado, como baruzeiro e pequizeiro, consorciados com culturas agrícolas e pastagem. O pequizeiro é considerado a árvore símbolo do Cerrado, conforme lei estadual em Goiás, devido à sua importância para a cultura, economia e o sustento das comunidades locais. A integração de espécies nativas e frutíferas se mostra estratégica, sobretudo em regiões específicas, aliando a conservação da biodiversidade ao uso econômico sustentável, valorizando produtos da sociobiodiversidade ao mesmo tempo em que recupera a cobertura vegetal, mantém a renda do produtor.
A escolha da espécie arbórea em um sistema integrado depende do objetivo do sistema, das condições do local e do conhecimento técnico. Critérios de seleção incluem a adaptação da planta às características do solo e clima, disponibilidade de mudas, uso dos produtos florestais, arquitetura da copa, velocidade de crescimento, serviços ambientais prestados e facilidade de estabelecimento. É fundamental que a inserção das árvores nos sistemas agropecuários obedeça às práticas de conservação do solo e da água, ao plantio em nível, ao favorecimento do trânsito de máquinas e à observância de aspectos comportamentais dos animais.
Espécies com características indesejáveis, como crescimento muito lento ou toxicidade para animais, devem ser evitadas. Se não for possível atender a todos os critérios, a prioridade deve ser dada ao objetivo do sistema, à adaptação local e ao conhecimento técnico. Por fim, é fundamental avaliar o mercado para os produtos oriundos do componente arbóreo a ser implantado — como madeira, sementes, frutos, fibras, entre outros — sendo indispensável a existência de demanda local ou regional que viabilize a comercialização desses produtos.
Em diversas situações, no entanto, o componente arbóreo poderá ser estabelecido com outros objetivos, como o uso da madeira para consumo próprio na propriedade, sombreamento, melhoria da ambiência, bem-estar animal ou ainda para fins de adequação ambiental. De acordo com o Novo Código Florestal, é permitido o cômputo de plantios de espécies frutíferas, ornamentais ou industriais — inclusive exóticas — na composição da área de reserva legal, desde que cultivadas em consórcio ou de forma intercalar com espécies nativas da região, dentro de sistemas agroflorestais. Ressalta-se, porém, que a área recomposta com espécies exóticas não pode ultrapassar 50% da área total a ser recuperada.
Na pecuária, a adoção do sistema de ILPF com linhas de árvores intercaladas com pastagens de braquiária traz benefícios tanto para o gado quanto para o solo. A sombra das árvores reduz o estresse térmico dos animais, melhorando o ganho de peso e o bem-estar, enquanto a ciclagem de nutrientes melhora a qualidade da forragem. Esse modelo tem sido testado em fazendas no Cerrado, onde os resultados apontam incremento na produção de carne e maior resiliência durante períodos de seca.
Sobre os serviços ambientais gerados, as pesquisas da Embrapa Cerrados confirmam que esses sistemas desempenham papel fundamental no armazenamento de carbono. Experimentos em áreas de ILPF mostraram incremento significativo no estoque de carbono no solo e na biomassa arbórea, contribuindo para mitigar os efeitos das mudanças climáticas. Além disso, a presença das árvores melhora a infiltração de água e reduz o escoamento superficial, protegendo nascentes e cursos d’água locais.
As experiências da Embrapa Cerrados mostram que a incorporação de árvores nos sistemas produtivos vai além da conservação ambiental: trata-se de uma estratégia que gera renda, reduz riscos produtivos e fortalece a segurança alimentar. Combinando ciência, tecnologia e práticas adaptadas à realidade dos produtores, a integração de árvores nas paisagens agrícolas representa um caminho para a transformação de áreas degradadas em sistemas produtivos e ambientalmente responsáveis.
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