Editorial – Entre páginas e pátrias: o Brasil que se escreve em cada leitura

 Editorial – Entre páginas e pátrias: o Brasil que se escreve em cada leitura

No Dia Nacional do Livro, uma celebração da palavra como herança, liberdade e espelho da alma brasileira

Em tempos de ruído, o livro continua sendo o silêncio que desperta o pensamento e reacende o diálogo entre o leitor e o mundo.

Em cada página virada há mais do que tinta e papel, há a memória de um povo que aprende a se reconhecer nas palavras. O Dia Nacional do Livro, celebrado hoje, 29 de outubro, é um convite à reflexão sobre o poder transformador da leitura e o papel do livro na construção da identidade brasileira.

A data marca a fundação da Biblioteca Nacional do Brasil, em 1810, no Rio de Janeiro, um acontecimento que atravessou o oceano junto com a história. Quando a família real portuguesa transferiu-se para o Brasil, trouxe consigo a Real Biblioteca de Portugal, um acervo de cerca de 60 mil volumes, manuscritos e mapas. Era mais do que uma coleção de obras: era um símbolo de conhecimento e de poder, um sopro de modernidade que começava a moldar os alicerces culturais do país.

Naquele gesto, o desembarque de livros em meio a uma colônia, nascia também a semente da Biblioteca Nacional, hoje uma das maiores da América Latina e guardiã de um acervo que preserva a trajetória de nossa língua, nossa arte e nossa história. O Dia Nacional do Livro é, portanto, mais do que uma data comemorativa: é uma celebração da palavra como herança e horizonte.

O calendário literário é generoso em lembranças. Em 18 de abril, o Dia Nacional do Livro Infantil homenageia Monteiro Lobato, o criador de mundos onde a infância brasileira aprendeu a imaginar. Já o Dia Mundial do Livro e do Direito de Autor, celebrado em 23 de abril e instituído pela Unesco, amplia a homenagem à literatura universal, às vozes que atravessam fronteiras e tempos, sem perder o poder de emocionar e transformar.

E se o país se descobre nas páginas de sua história, cada leitor também se reconhece nas páginas que o formaram.
Na minha infância, o livro era uma janela aberta para o desconhecido, o início de uma travessia silenciosa. Na juventude, ele se fez espelho, companhia e inquietação. Dom Casmurro, de Machado de Assis, ensinou-me as sutilezas da dúvida e da alma humana; Olhai os lírios do campo, de Érico Veríssimo, mostrou-me a delicadeza das escolhas e o valor da sensibilidade; Feliz Ano Velho, de Marcelo Rubens Paiva, foi um grito de liberdade e de dor, um retrato da juventude que busca sentido em meio à perda; e Brasil: Nunca Mais, de Dom Paulo Evaristo Arns, marco de resistência e denúncia, abriu-me os olhos para a força da memória e o dever da verdade.

Há outros livros que também me acompanharam, alguns ficaram nas estantes, outros vivem em mim. Todos, porém, deixaram marcas: foram bússolas em tempos de incerteza, abrigo nas horas de solidão, pontes para compreender o mundo e a mim mesma.

Celebrar o livro é celebrar a liberdade. É afirmar que, enquanto houver uma história a ser contada, haverá também um leitor disposto a sonhar. Porque o livro, mais do que um objeto, é um abrigo, onde o pensamento encontra morada e o país se reencontra com sua própria voz.

 

Referências:
  1. Fundação Biblioteca Nacional. Histórico Institucional. Disponível em: https://www.bn.gov.br/sobre-bn/historia. Acesso em: 29 out. 2025.
  2. Ministério da Cultura. Biblioteca Nacional do Brasil: patrimônio e memória. Disponível em: https://www.gov.br/cultura. Acesso em: 29 out. 2025.
  3. Câmara dos Deputados. Dia Nacional do Livro Infantil é comemorado em 18 de abril. Agência Câmara de Notícias, 2024. Disponível em: https://www.camara.leg.br. Acesso em: 29 out. 2025.
  4. UNESCO. World Book and Copyright Day – 23 April. Disponível em: https://www.unesco.org. Acesso em: 29 out. 2025.
Foto em destaque: Academia de Letras do Noroeste de Minas

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