Editorial – Uma derrota que custa caro ao país

A rejeição da MP 1303 aprofunda a desigualdade e fragiliza o pacto social que sustenta o Estado brasileiro
A rejeição, pela Câmara dos Deputados, da Medida Provisória 1303, em outubro de 2025, foi interpretada por muitos como uma derrota política para o governo federal. Mas, para além do embate partidário, trata-se de uma derrota para o país e para o ideal de justiça tributária que o Brasil tanto necessita consolidar.
A MP 1303 previa a cobrança de impostos sobre os super ricos, incluindo taxação de investimentos de alta renda, apostas esportivas e criptomoedas, com o objetivo de garantir recursos para programas sociais essenciais no orçamento de 2026. Era uma alternativa de arrecadação para compensar o recuo no aumento do IOF e fortalecer políticas públicas em áreas como saúde, educação e transferência de renda.
Foram 251 votos contra 193 pela manutenção da medida. Todos os deputados do PT (64), PDT (14), PSOL (13) e PCdoB (9) votaram pela continuidade da MP, enquanto partidos como PL (73), União (46), PP (40) e Republicanos (29) concentraram os votos pela derrubada. O resultado escancarou a divisão de um Congresso que, mais uma vez, optou pelo cálculo eleitoral em detrimento do interesse coletivo.
A proposta não visava penalizar o contribuinte comum, nem sufocar o setor produtivo, mas corrigir distorções históricas de um sistema tributário que, há décadas, pesa sobre os ombros da maioria e alivia a elite econômica. Ao rejeitar a MP, o país perdeu a chance de avançar na busca por um modelo mais justo, em que quem tem mais contribui proporcionalmente mais.
Do lado do governo e de defensores da medida, a derrubada da MP foi vista como um ataque à justiça tributária e uma perda de cerca de R$ 30 bilhões na receita esperada para 2026, recursos que agora precisarão ser compensados por meio de cortes, aumento de outros tributos ou redução de investimentos públicos. Além disso, a derrota expôs a fragilidade da articulação política do Executivo e aprofundou a tensão com o Centrão e a oposição, abrindo novo capítulo na disputa por espaço e poder no Congresso.
Já os que celebraram a rejeição, entre eles lideranças da oposição, entidades empresariais e o setor financeiro, a classificaram como uma vitória contra a irresponsabilidade fiscal e a criação de novos impostos. Para a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e o agronegócio, a decisão preserva a competitividade e o crédito rural, considerados vitais para o crescimento econômico.
Mas, na essência, o que se perdeu foi mais do que uma medida de arrecadação. Perdeu-se um passo rumo à equidade tributária, uma oportunidade de fortalecer o Estado e sustentar políticas que garantem dignidade à população. A escolha do Congresso, ao priorizar o populismo fiscal e o jogo político, enfraquece as bases de um desenvolvimento mais equilibrado e solidário.
O país precisa de reformas estruturais, de diálogo entre poderes e de responsabilidade compartilhada, não de disputas que sacrificam o bem comum em nome de interesses imediatos.
A rejeição da MP 1303 é, portanto, mais do que uma manobra parlamentar: é o reflexo de um Brasil que ainda hesita entre o privilégio e a justiça.
E enquanto essa escolha persistir continuará custando caro, à economia, à democracia e à esperança de milhões que dependem de um Estado forte e comprometido com todos, não apenas com alguns.
Referências
- Agência Câmara de Notícias – Câmara rejeita MP 1303 que tributava super ricos e previa novas fontes de arrecadação (outubro de 2025).
- Agência Brasil – Governo lamenta derrota da MP 1303 e fala em perda de R$ 30 bilhões na arrecadação de 2026.
- G1 – Entenda o que previa a MP 1303 e por que sua rejeição representa uma derrota política e fiscal.
- Valor Econômico – Mercado vê rejeição da MP 1303 como vitória contra aumento de impostos.
- Folha de S.Paulo – Derrota expõe fragilidade da articulação do governo no Congresso e amplia crise com o Centrão.
- CNN Brasil – MP 1303: o que muda com a rejeição e os impactos fiscais esperados.
A editora
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